Lírico

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Greenland
Toda eu sou alma. Todo eu sou frio, branca como a neve. Toda eu sou sonho, céu, nuvem. Toda eu sou girassol. Toda eu serei tua, se assim o entenderes.

7 de abril de 2012

Delírios intersticiais



“O fim é desespero, o desespero é medo, o medo é tudo e o tempo é escasso. Choro pelos cantos que não são mais que ninhos de deprimência convidativos a desaires humanos. Choro e solto o mais leve gemido, uma dor miudinha mas constante que não desaparece, não abranda, sempre incomoda. Estive, estou mas não mais estarei. Tudo é cansaço! Os meus olhos ardem como bolas de fogo vermelho, do mais incandescente que alguma vez vira. Não sinto as mãos, nem imagino o que me está a fazer escrever como um louco, um irracional consciente dos actos que não fez, não fiz, nunca faria, isso.

              O contraste entre espaços vazios se foi, a noção de profundidade é algo passado, passageiro, deveras momentâneo, os contornos ficaram menos nítidos e neste momento não consigo nem diferenciar as minhas personalidades. Escrevo, escreverei. Rabiscarei até que a fome me mate e o ofício me queime as pálpebras; um dia, terei uma casa feita de papel, de todo aquele que espezinhei e torturei até à exaustão com a tinta azul e preta, por vezes prateada. Não sinto, não posso, não mando.

              Hoje quero apenas ir por onde nenhum ser humano desejaria, pisar os caminhos pestilentos e envolver-me na lama. Conservar-me até que toda a Humanidade desejasse viver em paz pelas épocas que entretanto colapsaram. Não tenho qualquer esperança. Nunca haverão almas suficientemente capazes de trazer ao mundo a resolução de todos os problemas. Isto porque terá de assim ser. Teremos de nos arruinar, uma, outra, milhentas mil vezes. E não aprenderemos. Continuará a ser a mesma guerra, os mesmos motivos, a mesma dor, o mesmo ódio e raiva e vingança e sede de poder.

              Não sei escrever, deixei até de saber contar. Que dia é hoje? Os anos passam, não dou nem por mim a dormir. Talvez não durma. Talvez não coma. Talvez não exista sequer. Ninguém me vê. Entretanto, passo na rua, não me olham, apressados. Coitados. Não tenho pena deles. Escolheram aquilo em que se tornaram ou alguém escolheu por eles. São pessoas, não merecem nada! Morrerei. E vou com a consciência de que já nada há para fazer. Parem de nascer.

Foste. E ninguém me ensinou a recordar-te.

              E por isso me tornei no que agora não vês. Estás longe, distante dos braços e tão presente em meus pensamentos. Vai embora! Não te quero aqui. Atormentas-me. Deixas-me louco! Revejo ainda o dia em que partiste sem sequer pronunciar um adeus. É tão fútil saber que aquilo que deveria ser verdadeiro, puro, completamente espontâneo é, na verdade, o que nos deseja acabar com o resto dos nossos dias, desaparecer sem deixar qualquer rasto ou ponta de ingenuidade. A inocência acaba quando se percebe o quão cruel é um sonho, a facilidade com que se torna no mais subtil dos pesadelos.

              Deixei de ver. Esmagaste-me os preconceitos, torceste toda a perspetiva criada por mim durante anos. E quero que morras, tanto como eu morri no dia em que me abandonaste. Levaste o brilho, a alegria, tudo o que eu tinha. E agora? Tornei-me num louco. Sim, é isto que a sociedade me chama. E porquê? Porque falo alto e grito e resmungo e canto e digo o que mais ninguém tem coragem de dizer. Mesquinhos.

Antes louco que inútil, diria eu.
Antes assim que simplesmente sim.

Adeus, Brízida.”
Inocêncio

Texto e fotografia: Bárbara

2 comentários:

Anónimo disse...

QUE LINDO ! é a primeira vez que visitei este blog e fiquei completamente apaixonada, por tudo...
Até fico admirada como é que não existem mais comentários. Muito bom mesmo.
Beijinhos, e continua <3

Bárbara disse...

Muito obrigada, Anónima! :)

Espero que continues a visitar o meu blog! Beijinhos*